terça-feira, agosto 12, 2008

NOCTÍVAGOS




À noite, todos os gatos são pardos. O que equivale a dizer que todos são iguais, seja na mais recôndita curva fechada, num beco sem saída ou no vão de uma qualquer escada. Muitos deles, solitários, vagueiam pelas ruas não em busca de alimento mas sim de um guia que lhes mostre a resposta para as questões que colocam a eles próprios.


Olharão os céus em busca de um sinal divino, deífico qui ça, e meditarão no dia-a-dia que levam e nas acções que tomam, invariavelmente. Sim, invariavelmente. Invariavelmente porque os erros, quando cometidos, pagam-se caro, são irreversíveis, muitas das vezes, e provocam no comum mortal o banal sentimento de culpa que se pode carregar por meses a fio.


A noite é um refúgio para muitos de nós nos questionarmos sobre o porquê daquela palavra dita, a acção tomada ou a atitude intrínseca que deixámos, sem querer, transparecer para os outros que nos rodeiam.


Muitas dessas reflexões ficam sem resposta. Vale a pena pelo humilde pensamento, pelo purgatório que infligimos a nós próprios.


O sono vem de seguida. Progressivamente, saímos das ruas, recolhemos ao abrigo e fechamos os olhos. Horas depois, o dia raiará sempre com a certeza de que as dúvidas que temos podem ser desfeitas… ou agravadas. Mas o dia aparece e tudo à nossa volta ganha um rasgo de luz determinante para podermos sorrir, de forma tola, às pessoas com que nos cruzamos. E esquecer os problemas. Mesmo que por algumas horas.


Bem-vindos ao admirável mundo dos noctívagos. Aqui não há consumo mínimo e só se pede a cada gato que seja mesmo pardo. Que não se destaque. Que pense. Que tire conclusões. Que se ajude a si próprio e, mesmo que daqui não saia com os problemas resolvidos, fique satisfeito por reflectir pessoalmente. Sozinho(a), é claro.



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